sábado, outubro 18, 2008

UMA PROPOSTA PARA O ENSINO DE FILOSOFIA NO ENSINO MÉDIO COM BASE NO ESTÁGIO


A Escola Pública está cada vez mais perplexa com a composição heterogênea dos alunos em sala de aula. O estagio realizado na Escola Estadual Abel Freire Coelho em Mossoró, turmas 1° A e 2º A do ensino médio serviu para que pudéssemos ter o diagnóstico de o quanto é necessário um aprofundamento da pedagogia para a aplicação do ensino de filosofia no ensino médio. A sondagem pedagógica escolar realizada no 1º semestre da escola mostrou uma série de conflitos a respeito dos temas da filosofia. No 1º A, o professor apresentava o conteúdo sobre “A Filosofia e o Conhecimento”. No 2º A, o conteúdo sobre “Política e Cidadania”. O modelo normativo, centrado no conteúdo, que lida com a transmissão, a comunicação de saber aos alunos. O professor mostra as noções, as introduz e fornece exemplos. O aluno primeiramente deve aprender, escutar, e deve prestar atenção; em seguida, treinar, se exercitar. O saber já está finalizado, já está construído. É uma situação é desesperadora. Um encontro semanal, classe cheia, diários de classe, correção de provas e reuniões, não há tempo nem condições para atender cada aluno individualmente.
A primeira solução seria a redução de horas aulas das outras disciplinas e adequação do número de classes, menos papelada que se tem que apresentar e de menos alunos em sala de aula. Infelizmente, resolver a situação desta forma não está ao alcance de nenhum professor. Cruzar os braços? Seguir o ritmo de certos docentes, que já estão acostumados com a escola pública? Não está de acordo com os princípios e a compreensão que tenho do que é ser professor.
Não se trata somente de haver distintos níveis de pontos de partida muito diferentes entre si, mas, mesmo entre esses diferentes problemas, encontramos alunos que possuem uma capacidade para aprender e outros que sofrem muito para aprender o conceito mais elementar de cada temática apresentada na sondagem durante o primeiro momento. De outro lado, existem ao menos dois grupos no que se refere à motivação para aprender, que não tem nada a ver a capacidade: há alguns alunos que apresentam uma enorme facilidade e não querem aprender nada, enquanto outros que apresentam mais dificuldades se mostram bastante interessados. Para não dizer que não há mais nada, ainda existem os indisciplinados, os que conversam durante as explicações, os que não fazem as tarefas nem em sala de aula, nem em casa e, há um desgaste muito grande em ficar chamando a atenção destes alunos o tempo todo.
Mas, na nossa prática dentro da sala de aula, passamos a trabalhar de outro modo. Trabalhamos com a proposta de ensinar a turma toda, independentemente das diferenças de cada um dos alunos, Em uma palavra, a sala de aula é um espaço educativo de construção de personalidades humanas, autônomas, críticas, e que todos os alunos aprendem a ser sujeitos construtores de suas identidades.
Como? sempre pensei que o que se queria era ensino individualizado para cada aluno!
No inicio aplicamos um questionário sobre o que os alunos já sabiam a respeito da Filosofia e o que esperavam da disciplina e de que maneira poderíamos ensinar debater e aprendermos Filosofia. Pois um dos propósitos da Filosofia é a busca da compreensão do que é esta diversidade. A outra parte do questionário buscava analisar o contexto socioeconômico do aluno. Pois entendemos que a sala de aula é o meio pelo qual se mede o grau das mudanças sócio educacionais e é nesse micro espaço que as reformas verdadeiramente se efetivam ou fracassam. Além de tudo isso, percebendo de que existem muitos estilos de aprendizagem diferentes: alguns alunos precisam de um tempo entre um questionamento e outro, mas outros não; uns utilizam um estilo analítico enquanto outros, um estilo sintético na aprendizagem; uns apenas escutam, enquanto outros observam. E com tudo, ainda há a questão dos interesses dos alunos, pois alguns já sabem muito claramente que desejam seguir no futuro carreira em diversas áreas e, a filosofia não está entre elas, não têm muito interesse e outros, fazem questão de dizer: nada que tenha filosofia! Deus me livre!
O trabalho apresentou resultado interessante, além do “desprezo pela Filosofia”, um pequeno avanço no saber, no que diz respeito à utilidade da filosofia para o cotidiano de cada um. Chegamos até pensar. É impossível atender a todos de uma forma individualizada com tantas diversidades. Como um professor em formação, pergunto: que posso fazer?
De acordo com os dados do questionário aplicado, começamos a entender um pouco cada aluno, no entanto ainda predomina a apresentação de conteúdos, as formas de organização do trabalho escolar que não se alinham na direção de uma educação de resultados para todos os alunos.
Não querendo adotar o discurso reformista, mas superar o sistema tradicional de ensinar e de aprender é um propósito que temos de efetivar urgentemente nas salas de aulas. Recriar o modelo educativo refere-se primeiramente ao que ensinamos aos alunos e a como os ensinamos. Há muito tempo que ensino e aprendizagem significa alunos com cabeças cheias de datas, fórmulas, conceitos, todos justapostos, fragmentados, enfim, o império das disciplinas estáticas e com muito, muito conteúdo. Escolas consideradas de qualidade ainda são as que centram a aprendizagem no conteúdo e que avaliam os alunos, quantificando respostas padrão. Seus métodos e práticas preconizam a exposição oral, a repetição, a memorização, os treinamentos, o livresco, a negação do valor do erro. São aquelas escolas que estão sempre preparando o aluno para o futuro: seja este a próxima série a ser cursada, o nível de escolaridade posterior.
Pensamos que um ensino e aprendizagem de qualidade se distinguem, quando é capaz de formar indivíduos dentro dos padrões requeridos por uma sociedade mais evoluída e humanitária, quando promove a interatividade entre os alunos, entre as disciplinas curriculares, entre a escola e seu entorno e o projeto escolar. Em nossa prática e método de ensino foi discutido com bases nas respostas, sobre o que é conhecimento, as formas de saber, a experimentação, a construção do conhecimento e como se aplica este saber no contexto filosófico da existência do homem na atualidade, mais especificamente no contexto aluno-professor-escola.
Nesses ambientes educativos ensinamos aos alunos a valorizar a diferença, pela convivência com seus pares, pelo exemplo dos professores, pelo ensino ministrado nas salas de aula, pelo clima sócio-afetivo das relações estabelecidas em toda a comunidade escolar sem tensões competitivas, solidário, participativo, colaborativo, visando a construção ética e cidadã do aluno.
Para ensinar a turma toda, partimos da idéia de que os alunos sempre sabem alguma coisa, de que todo educando pode aprender, mas a seu modo e a seu ritmo e de que o professor não deve desistir, mas nutrir uma elevada expectativa em relação à capacidade de seus alunos conseguirem vencer os obstáculos escolares, apoiando-os na remoção das barreiras que os impedem de aprender. Entendendo que o sucesso da aprendizagem tem muito a ver com a exploração dos talentos de cada um e que a aprendizagem centrada nas possibilidades e não nas dificuldades dos alunos é uma abordagem efetiva.
Propomos atividades e debates sobre o mito e o senso comum, verdade e mentira para o 1º A. Para a turma do 2º A, foi proposto um debate após as pesquisas realizadas sobre cidadania e política, levando em consideração o momento político das eleições atuais. E que fossem apresentadas respostas sem se preocuparem com o estilo das mesmas, que poderiam ser abordadas por diferentes níveis de compreensão e de desempenho de cada um e, em que não se destaquem os que sabem mais ou os que sabem menos, pois tudo o que essas atividades propõem pode ser disposto, segundo as possibilidades e interesses dos alunos que optaram por desenvolvê-las. Debates, pesquisas, registros escritos, falados, observação; vivências foram processos indicados para realizar essas atividades, além, evidentemente, dos conteúdos da disciplina, que estavam sendo aplicado, sem anteciparmos as repostas e que aos poucos eram chamados espontaneamente a esclarecer os assuntos estudados. Apresentávamos também mapas conceituais para que aos poucos fossem adquirindo conhecimentos que os orientavam para formarem seus próprios conceitos.
Embora como citamos antes, constatou-se uma aprendizagem. No entanto o resultado não superou as expectativas, pois o menosprezo pela disciplina ainda foi evidente. A avaliação do desenvolvimento dos alunos foi medida por coerência com a prática referida anteriormente. Trata-se de uma análise do percurso de cada estudante, do ponto de vista da evolução de suas competências ao resolver problemas de ordem argumentativa e comunicativa em sala de aula. Visto que no estágio não temos tempo suficiente para uma avaliação mais aprofundada. No entanto o professor das turmas, apesar de levar em consideração os temas aplicados nas pesquisas e nos debates, utilizou provas de perguntas objetivas, que segundo ele, é única forma adotada por ele para uma medição do conhecimento de filosofia do aluno.
É necessário criar contextos educacionais capazes de ensinar a Filosofia a todos os alunos o que demanda uma reorganização do trabalho escolar. Tais contextos diferem radicalmente do que é proposto pedagogicamente para atender às especificidades dos educandos que não conseguem acompanhar seus colegas de turma, por problemas, dificuldades de ordem relacional, motivacional, cultural. Nestes casos são necessárias adaptações de currículos, a facilitação das atividades escolares, além dos programas para reforçar as aprendizagens ou mesmo acelerá-las, em casos de maior defasagem idade. Foi o que presenciamos nas salas de aulas que estamos estagiando, alunos fora da faixa de idade que já possui uma experiência de vida que o torna desinteressado pelos temas apresentados aos alunos que estão em sua faixa etária normal.
O professor que ensina a turma toda compartilha com seus alunos a autoria dos conhecimentos produzidos em uma aula; trata-se de um profissional que reúne humildade com empenho e competência para ensinar, pois o falar e o ditar não são mais os seus recursos didático-pedagógicos básicos. O ensino expositivo não cabe nas salas de aula em que todos interagem e participam ativamente da construção de idéias, conceitos, sentimentos, valores.
Um ponto crucial do ensinar Filosofia a turma toda é reconhecer o outro em sua inteligência e valorizá-lo, de acordo com seus saberes e com a sua identidade sócio-cultural. Sem estabelecer uma referência, mas investindo nas diferenças e na riqueza de um ambiente que confronta significados, desejos, experiências; o professor deve garantir a liberdade e a diversidade das opiniões dos alunos e nesse sentido ele é obrigado a abandonar crenças e comportamentos que negam ao aluno a possibilidade de aprender a partir do que sabe e chegar até onde é capaz de progredir. O nosso desafio como educadores é reunir alunos de diferentes níveis, diante de uma situação de ensino, em grupos desiguais, pois assim é que se passa na vida e é assim que a escola deve ensinar a ter sucesso na vida.

Marcilio Reginaldo



REFERÊNCIAS:


ANTUNES, Celso.Avaliação Significativa contras as Provas Mecânicas: Vigotsky e a Zona de Desenvolvimento Proximal. In: ABC Educativo nº6, 2005

PERRENOUD, Philippe. Construir as competências desde a escola; trad. Bruno Charles Magne. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1999.